quinta-feira, 11 de outubro de 2012

A missão profética da Igreja

Os Profetas do Antigo Testamento são ponto de partida e referência para a compreensão da missão profética da Igreja. O Profetismo pressupõe: 1) um chamado da parte de Deus; 2) a reação de quem é chamado; 3) a resposta ao chamado. Deus escolhe e chama quem Ele quer. A reação em geral é de perplexidade, susto, a começar pela dúvida se é Deus mesmo quem está chamando. O menino Samuel, à noite, no templo, ao ouvir a voz que lhe chamava: "Samuel, Samuel", pensa que é o sacerdote Eli que lhe chama. Quando entende que a voz é de Deus, responde: "Fala, pois teu servo ouve" (1 Sm 3,10).

Além da dúvida, há também a resistência humana. Isaías se considera um homem de lábios impuros (Is 6,5), mas depois responde: "Eis-me aqui, envia-me a mim" (6,8). Jeremias contesta dizendo: "eu não sei falar porque sou ainda criança" (Jr 1,6); e a resposta de Deus: "eis que ponho as minhas palavras em tua boca" (Jr 1,9). Ezequiel reclama do povo: são "filhos de cabeça dura e coração de pedra, bando de rebeldes" (Ez 2,4.5). Amós ouve do sacerdote Amasias que "em Betel não deverás insistir em profetizar", enquanto Deus lhe diz: "vai profetizar para Israel, meu povo" (Am 7,15). E assim por diante. Jonas resmunga o mais que pode, mas acaba indo falar ao povo de Nínive, e este se converte.

Jesus de Nazaré é reconhecido como Messias (Cristo) porque, no seu ministério, realiza e cumpre o que os profetas anunciaram acerca daquele que Deus enviaria para redimir a humanidade do pecado e libertá-la das mais diversas opressões, doenças, espíritos malignos, injustiças, fome, etc. Quando João Batista, da prisão, manda seus discípulos perguntarem: "és aquele que há de vir ou devemos esperar outro?" (Lc 7,20), Jesus, primeiro, "curou a muitos de doenças, de enfermidades, de espíritos malignos, e restituiu a vista a muitos cegos" (v. 21); depois lhes respondeu: "Ide contar a João o que estais vendo e ouvindo: os cegos recuperam a vista, os coxos andam ... e aos pobres é anunciado o Evangelho" (v. 22).
Jesus Cristo é antes de tudo um profeta porque é homem da Palavra. Realiza o anúncio (kerygma) e o ensino (didaquê). É um mestre (didáskalos). E, na sua didática, qual é o anúncio que proclama? Que "o tempo se completou e o Reino de Deus está próximo" (Mc 1,14-15). E que Deus é Pai – Pai nosso – um pai de bondade, de ternura, de misericórdia, de compaixão. Um pai que acolhe em seus braços o filho que foi embora, que se perdeu, mas que se arrepende e volta. Pai que festeja o retorno do filho, no abraço e na festa (cf. Lc 15,11-32). O povo, ao ver e ouvir Jesus, ficava admirado: "extasiavam-se com seu ensino, porque lhes ensinava com autoridade" (Mc 1,22); "nunca vimos coisa igual!" (Mc 1,12); "de onde lhe vem tudo isto? E que sabedoria é esta que lhe foi dada?" (Mc 6,2); "um grande profeta surgiu entre nós e Deus visitou o seu povo" (Lc 7,16).

Os apóstolos, a começar pelo grupo dos Doze, chamados cada um pelo nome, foram escolhidos por Jesus para realizarem e continuarem sua missão. Dá-lhes "autoridade de expulsar os espíritos imundos e de curar toda a sorte de males e enfermidades, ... proclamando que o Reino dos Céus está próximo" (cf. Mt 10,1.7). Colocados à frente dos futuros discípulos e discípulas, indicam que a Igreja tem a missão profética de continuar a presença libertadora e a obra salvífica de Jesus na História.

Rejeição e humilhação. Os profetas, ao proclamar a palavra de Deus, falar a verdade, defender os pobres, proclamar a justiça, denunciar a injustiça, são incompreendidos, perseguidos e até martirizados. Enfrentam com coragem os poderosos, como Elias diante do rei Acab, Natan diante do rei Davi, João Batista diante de Herodes, etc. Nos salmos, a realidade da rejeição se transforma em oração: "Senhor, estamos fartos do escárnio dos ricaços e do desprezo dos soberbos" (cf. Sl 122/123,3-4).

Cristo é rejeitado, preso, condenado, maltratado e morto (e morte de cruz, cf. Fl 2,8) por determinação das autoridades religiosas e do poder romano. De fato, aos apóstolos já predissera: "eis que eu vos envio como ovelhas entre lobos ... Guardai-vos dos homens: eles vos entregarão aos sinédrios e vos flagelarão ... E, por causa de mim, sereis conduzidos à presença de governadores e reis, para dar testemunho perante eles e perante as nações" (Mt 10,16-18).

O livro dos Atos dos Apóstolos traz diversas passagens que narram perseguições, angústias, prisões pelas quais passaram Pedro, Paulo e os outros apóstolos. A Timóteo, discípulo e colaborador, Paulo exorta: "assume a tua parte de sofrimento como um bom soldado de Cristo Jesus" (2 Tm 2,3). No final de sua vida, sente que será oferecido em sacrifício e que receberá a coroa do martírio (cf. 2 Tm 4,6-8).

Confiança em Deus. A força do Profeta vem de Deus, conforme revelou Cristo a Paulo: "basta-te a minha graça. Pois é na fraqueza que a força se manifesta" (2 Cor 12,9a). Paulo, sabendo em quem colocou sua confiança, exprime, de diversos modos, essa certeza: "se Deus é por nós, quem será contra nós?" (Rm 8,31); "quem nos separará do amor de Cristo?" (Rm 8,35); "tudo posso naquele que me dá força" (Fl 4,13); "eu me gloriarei das minhas fraquezas, para que a força de Cristo habite em mim" (2 Cor 12,9b).

E a Igreja reza: "ó Deus, que pela humilhação do vosso filho, reerguestes o mundo decaído, enchei os filhos e filhas de santa alegria e dai aos que libertastes da escravidão do pecado o gozo das alegrias eternas" (14º domingo TC).

A humildade é virtude a ser exercitada pelo cristão e evangelizador: "aquele que se exaltar será humilhado, e aquele que se humilhar será exaltado" (Mt 23,12; Lc 14,11; 18,14). Sofrer e ser humilhado são conseqüências de quem anuncia a palavra de Deus e não a sua; a verdade do Evangelho e não a própria. De quem se coloca a serviço, como fez o Cristo: "eu, porém, estou no meio de vós como aquele que serve" (Lc 22,27).

A Igreja continua a missão dos profetas, dos apóstolos e do próprio Filho de Deus, anunciando, testemunhando, realizando sinais, para a vida do mundo. Nisto consiste sua essência, sua verdadeira identidade, sob a orientação e inspiração do Espírito Santo, na força da oração.

+Dom Armando Martín Gutierrez
Bispo Diocesano

Nenhum comentário:

Postar um comentário